domingo, 22 de junho de 2008

Paloma

Hoje pela primeira vez na minha vida, quase atingindo a maioridade, presenciei um velório. Quando cheguei, havia poucas pessoas, e até então não tinha achado nada demais naquilo. Paloma era uma menina de 15 anos apenas, que necessitava de cuidados especiais. Nasceu com um tumor na coluna, sua expectativa de vida não era mais longa do que a que teve. Sua mãe sabia dos riscos da gravidez, ex-fumante, já no auge de seus 40 anos. No entanto, abriu mão do emprego, muito bem remunerado, e passou a dedicar a vida à sua filha. Essa era a história que eu sabia. Pensei não ser tão difícil quanto imaginava ir a um velório afinal. A mãe tinha em uma das mãos um terço, e no outro braço o casaco da filha que constantemente alisava e enxugava-lhe as lágrimas. Começou a missa, mas logo ela chegou ao fim. Ouvi minha Vó dizer "É agora...". Não entendi, mas também não perguntei, esperei para ver. Eu a vi levantar, gemia tanto que até eu pude sentir aquela dor. Iriam fechar o caixão. Juntou suas forças dando um último adeus a sua tão querida Paloma:
- Filha. Filha muito obrigada pelos quinze anos que você esteve em minha vida. Muito obrigada pelo seu amor, pela sua luz minha filha. Eu só tenho a agradecer a Deus pela pessoa maravilhosa que você é. Que nossa senhora te guie minha filhinha.
Ela soluçava:
- Vai minha filha, você tem que deixar mamãe não é? - estavam tentando fechar a pequenina urna - Mamãe te ama muito sabia filha?
Beijou-lhe a testa, virou para os presentes e disse:
- Paloma detestava choros. Gostaria de pedir uma salva de palmas para ela.
Esse foi o último som que ecoou no salão.
O de palmas.
Meus problemas parecem míseros diante do dela.
Uma saudade sem fim.

Lembrei que durante a missa abracei meu pai e deitei minha cabeça no ombro dele. A sua respiração embaraçava uma das lentes de meus óculos, mas no instante seguinte, ela voltava ao normal. Assim também passa o tempo, em um piscar de olhos. E ali vi o verdadeiro porquê Renato Russo dizia que é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã.

Maio/2007

9 comentários:

Anônimo disse...

LêÇ estou abrindo o seu blog somente hoje, pois recebi um e-mail de Flavia avisando da existencia desse blog. Fiquei realmente encantado com a sua sensibilidade, veia poetica, que traduz exatamente o que você é e sente. Continue assim, dotando-nos de suas doces palavras e emocões. Um beijo do seu tio avô - Jonas

Teacher's Box of Tricks disse...

Nossa, Lê... Que triste!
Fiquei com um nó gigantesco na garganta!

Ele ainda tá se desfazendo...

Anônimo disse...

Letícia,
Mui embora todos a chamem de "LÊ", eu continuo a chamá-la de "Letícia", que quer dizer "alegria", muito mais gostoso de pronunciar-se...
Sua verve é linda e tem um quê de poesia...
Continue para o deleite de seus leitores.
Um beijão do seu avô
Jairo
bsb 23/06/2008

Anônimo disse...

Prima,
To sempre aki
bjs
JTN
P.S: Ta podendo hein ate meu avo comentou

Anônimo disse...

Embora muito triste a história, muito bonita a sua postagem e a mensagem que você deixou. Mas ainda discordo de nosso querido Renato Russo, quando ele diz que é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã. O meu conselho - que não sei se vale lá grande coisa - é aproveitar o momento não como o último, mas como o primeiro. Por experiência própria, acho melhor e mais gostoso.
Beijão bem grandão, querida!
=*******************

Unknown disse...

Adoro lê o que vc escreve, sempre impregnado de simplicidade e autenticidade.
Derramar sentimentos no papel é para mim um jeito especial de se olhar bem no íntimo.
Às vezes nos pequenos "se" de cada texto ocorre a revelação de nosso verdadeiro eu. Você sempre se mostra por inteiro. Como eu já disse e repito, cheia desta luz que você carrega.
Sempre gostei de escrever, meus rabiscos repousam por ai em velhos cadernos, agendas, blocos;em um tempo em que blogs não existiam ... quem sabe um dia eles renasçam nestas páginas virtuais e possamos trocar figurinhas ?
Te admiro muito ! Bjs !

Anônimo disse...

Letícia:
Só agora é que tomei conhecimento do seu blog, apesar de você já ter avisado da existência dele.
Quanto ao texto é de uma profundeza sem tamanho. Você tem carisma no que relata. Continue exercitando esse seu lado de poeta, repórter das coisas existenciais.
Um beijo do
Vô Zezinho

treta disse...

seu texto me emocionou. lembrei de certos velórios pelos quais passei. me lembro que meu choro se tornava mais intenso quando ouvia ou via que meus queridos estavam chorando.
as lágrimas também contagiam, não só os sorrisos... mas, como vc colocou bem, elas podem ser lições valorosas.
que bom que estou viva e ouço a música!

ei ei, psiiiu

;-b

Anônimo disse...

Engraçado né, agente fala tanto sobre isso, sobre a importancia das pessoas de nossa vida e é verdade, quando se le um texto como esse ( que ficou muito bom Lê pode ter certeza disso ) vc senti que deve dar mais valar, a olhar mais, a cuidar mais, masssss outro fato é, que só se da valor quando se perde, e nossa, perder alguem pra sempre, a morte em si, nossa , essa sim é uma dor que eu nao quero pra mim jamais, mesmo sabendo que ninguem vive pra sempre!!! beijos Lê, e como sempre, otima escritora! =) =****